Alunos do 5º Período do Curso de Letras Da Faculdade São MIguel

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quinta-feira, 7 de junho de 2012

Resenha: A língua de Eulália - Marcos Bagno.


Resenha do livro: A língua de Eulália, a novela sociolingüística,
Marcos Bagno, Editora Contexto, 2008

Curso: Letras 3º Período

Aluno: Luciano Gomes da Silva



A notável simplicidade com que Marcos Bagno trata os fenômenos sociolinguísticos nesta obra publicada em 1997, A Língua de Eulália, teve um forte impacto desde então; segundo ele várias mudanças importantes ocorreram no campo de educação linguística no Brasil. As reflexões provocadas nesta e outras obras nesta área de pesquisa demonstram que a maneira como encarados as pessoas consideradas incultas quanto que ao uso da norma padrão tem mudado sensivelmente. Marcos Bagno nesta novela sociolinguística procura mostrar que o uso de uma linguagem “diferente”, nem sempre pode ser considerado um "erro de português".

A novela inicia-se com a crítica quanto à forma “errada” com que Eulália conversa com as pessoas, esta variação linguística é explicada por meio de uma troca de experiências quando Vera, 21 anos estudante de Letras; Silvia mesma idade, estudante de Psicologia e Emília, 19 anos estudante de Pedagogia, vão à casa da tia de Vera, a professora Irene, na cidade paulista de Atibaia para curtirem alguns dias de férias de inverno e descansarem da agitada vida de professoras do curso primário em São Paulo. Lá descobrem lições preciosas com Eulália que jamais esquecerão. Os diálogos iniciam-se quando Eulália pronuncia palavras de forma considerada errada, como "os fósfro", "os home", "as pranta", "os broco", "as tauba", "os corgo", "a arvre", "trabaiá; são na verdade formas diferentes de pronúncia, e que não podem ser vistas pelos educadores como "erradas" ou "pobres", mas sim diferentes do padrão vigente que é a norma culta, aliás a própria definição “norma culta” é carregada de preconceito pois infere que as outras variantes linguísticas são incultas.

Em resposta a forma irônica com que as meninas zombam de Eulália Irene retruca com uma frase em italiano e em galego-português a professora Irene, que também é Doutora em Linguistica, chama a atenção das estudantes para que reflitam se realmente a língua que se fala no Brasil é o português; uma vez que os brasileiros não compreendem o português do século XII e nem o português falado em Portugal. A conclusão a que chegam é que o nosso "português" não existe, por ser uma língua formada por muitos outros idiomas e dialetos, totalmente mutáveis e variáveis. Os versos da Divina Comédia, de Dante e a Cantiga de amor da Cantiga da Ribeirinha abrem o apetite de conhecimento das meninas para uma noite de reflexão. Ela explica que o que existe na verdade, são variações do português. Em diferentes regiões do país o português é falado com sotaques e características muito próprias, mas a norma culta conhecida também como a norma padrão como já dissemos, foi o modelo adotado oficialmente pela Academia Brasileira de Letras e consequentemente influenciou toda a pedagogia no Brasil a partir das imposições das gramáticas tradicionais que não levam em conta estas variáveis.

Um fato marcante que a obra, o livro A Língua de Eulália mostra é que na comparação entre o “português padrão” e o “português não padrão” o maior preconceito apontado não são exatamente as diferenças linguisticas que prevalecem, mas sim, as diferenças sociais.

Desvendando a sociolinguistica de maneira especial, o autor se preocupa em transmitir através desta obra, que por mais estranhas que possam parecer certas pronúncias, por mais incompatíveis que sejam com o português padrão que aprendemos na escola, cada uma dessas palavras têm uma origem perfeitamente explicável dentro da história da língua portuguesa. Irene ao longo da oficina linguística viva que é Eulália desmistifica o mito da língua única, demonstra diferentes variações linguísticas regionais, as mudanças da língua ao longo da história, explica para as meninas a história da norma padrão, faz um quadro comparativo entre o português padrão e o português não padrão e o longo caminho do latim vulgar ao português padrão.

Irene combinou com as meninas que as suas aulas fossem realizadas na “escolinha” apelido dado ao pequeno cômodo de sua casa. É neste ambiente simples que a professora explica de forma complexa a rotacização do “L” nos encontros consonantais fazendo um quadro comparativo entre o latim, francês, espanhol e o português. Explica a razão por que os versos de Camões pareciam ter palavras consideradas erradas para o português padrão como: frauta, frechas, Ingrês, pranta. Irene então ironiza por que não rimos de Camões como rimos de Eulália? Vale lembrar que toda a problemática levantada pelo personagem Irene está relacionado com o tema preconceito linguístico esta que outra maravilhosa obra de Marcos Bagno.

A obra encerra-se como é de se esperar de uma autoridade nesta área tão recente do ponto de vista lingüístico no Brasil, O professor Marcos Bagno encerra esta obra agradecendo aos seus “detratores” como ele mesmo intitula pela crítica pela qual a maioria de seus estudos linguísticos tem sido fundamentado, penso que “A língua de Eulália” é um desabafo de um estudioso dos fenômenos linguísticos não desprovido de conhecimento mais de um erudito que assim como Eulália tem muito a nos ensinar.


*Luciano Gomes da Silva é aluno do curso de graduação em Letras pela Faculdade São Miguel

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